O essencial que permanece e sustenta o nosso ser e agir.

15/02/2013 07:50

 

Primeira leitura (Isaías 58,1-9a)

 

Leitura do Livro do Profeta Isaías.

Assim fala o Senhor Deus: 1“Grita forte, sem cessar, levanta a voz como trombeta e denuncia os crimes do meu povo e os pecados da casa de Jacó. 2Buscam-me cada dia e desejam conhecer meus propósitos, como gente que pratica a justiça e não abandonou a lei de Deus. Exigem de mim julgamentos justos e querem estar na proximidade de Deus:3“Por que não te regozijaste, quando jejuávamos, e o ignorastes, quando nos humilhávamos?” — É porque no dia do vosso jejum tratais de negócios e oprimis os vossos empregados. 4É porque, ao mesmo tempo que jejuais, fazeis litígios e brigas e agressões impiedosas. 

Não façais jejum com esse espírito, se quereis que vosso pedido seja ouvido no céu.5Acaso é esse jejum que aprecio, o dia em que uma pessoa se mortifica? Trata-se talvez de curvar a cabeça como junco, e de deitar-se em saco e sobre cinza? Acaso chamas a isso jejum, dia grato ao Senhor? 

6Acaso o jejum que prefiro não é outro: quebrar as cadeias injustas, desligar as amarras do jugo, tornar livres os que estão detidos, enfim, romper todo tipo de sujeição? 7Não é repartir o pão com o faminto, acolher em casa os pobres e peregrinos? Quando encontrares um nu, cobre-o, e não desprezes a tua carne.

8Então, brilhará tua luz como a aurora e tua saúde há de recuperar-se mais depressa; à frente caminhará tua justiça e a glória do Senhor te seguirá. 9aEntão invocarás o Senhor e ele te atenderá, pedirás socorro, e ele dirá: “Eis-me aqui”. 

- Palavra do Senhor. 
- Graças a Deus.

 

Salmo (Salmos 50)

 

— Ó Senhor, não desprezeis um coração arrependido!
— Ó Senhor, não desprezeis um coração arrependido!

— Tende piedade ó meu Deus, misericórdia! Na imensidão de vosso amor, purificai-me! Lavai-me todo inteiro do pecado, e apagai completamente a minha culpa!

— Eu reconheço toda a minha iniquidade, o meu pecado está sempre à minha frente. Foi contra vós, só contra vós, que eu pequei, e pratiquei o que é mau aos vossos olhos!

— Pois não são de vosso agrado os sacrifícios, e, se oferto um holocausto, o rejeitais. Meu sacrifício é minha alma penitente, não desprezeis um coração arrependido!

 

Evangelho (Mateus 9,14-15)

 

— O Senhor esteja convosco.
— Ele está no meio de nós.
— PROCLAMAÇÃO do Evangelho de Jesus Cristo + segundo Mateus.
— Glória a vós, Senhor!

Naquele tempo, 14os discípulos de João aproximaram-se de Jesus e perguntaram: “Por que razão nós e os fariseus praticamos jejuns, mas os teus discípulos não?”

15Disse-lhes Jesus: “Por acaso, os amigos do noivo podem estar de luto enquanto o noivo está com eles? Dias virão em que o noivo será tirado do meio deles. Então, sim, eles jejuarão”. 

- Palavra da Salvação. 
- Glória a vós, Senhor.

 

Homilia

 

Estamos na Quaresma, tempo especial para treinarmos aquilo que precisa compor o dia a dia do cristão, como é próprio de cada tempo litúrgico: «A penitência se exprime de formas muito variadas, em particular com o jejum, a oração, a esmola. Essas e muitas outras formas de penitência podem ser praticadas na vida cotidiana do cristão, em particular no tempo da Quaresma e no dia penitencial da sexta-feira» (Compêndio CIC nº 301).

 

Um treinamento no essencial, que é recordado no Evangelho de Mt 9, 14-15, no qual, perante o questionamento dos discípulos do penitente João Batista, Jesus Cristo indica a presença do Esposo, como Aquele que dá sentido novo a todas as pessoas e práticas. Sinceramente, os judeus e os discípulos do Batista eram “profissionais” das penitências, mas, ao tratar de um sentido radical que pode tudo renovar, aí o Cristianismo tem algo fundamental a acrescentar: «Acaso os convidados do casamento podem estar de luto enquanto o noivo está com ele?» (Mt 9, 15).

 

Jesus é realmente o Emanuel esperado, a manifestação do Deus conosco (cf. Mt 1, 23), mas, ao mesmo tempo, é o Deus-esposo de Israel, numa linguagem esponsal e reveladora, bem conhecida pelo Antigo Testamento (cf. Is 54, 4-8; Jr 2,2; Os 1-3). Isto porque, no Mistério de Cristo, convergiram as promessas de um Deus fiel e próximo. O mais próximo e presente do que nunca: «Não mais terás o nome de abandonada, nem tua terra será chamada de Lugar Ermo. Ao contrário, serás chamada de Meu Bem e tua terra será chamada de senhora, pois o Senhor se apaixonou por ti, a tua terra estará casada» (Is 62, 4).

 

Voltemos, no entanto, a atenção para a expressão do Cristo que enfatiza a palavra «convidados» primeiramente, ou seja, não tiranizados nem laçados na rua. O amor próximo de Deus, revelado em Cristo Jesus, atrai e quer conquistar, converter, mas não se impor. Outra característica que precisa marcar todo e qualquer esforço quaresmal está implícito na expressão «o noivo está com ele». Pode-se fazer paralelo à definição de amor, ensinada por João, à Comunidade: «Nisto consiste o amor: não fomos nós que amamos a Deus, mas foi ele que nos amou e enviou o seu Filho como oferenda de expiação pelos nossos pecados» (1Jo 4, 10).

 

O Pai das Misericórdias é quem quis, primeiramente, esta proximidade do Filho com cada um de nós. Equivale dizer: É da Vontade de Deus que o Esposo, Emanuel e Salvador, esteja conosco no tempo e seja a razão profunda do nosso ser e agir. Por isso, a razão da nossa penitência será sempre – precisa ser – uma resposta de amor que nos aproxima, converte-nos Àquele que, antes de tudo e todos, quis livremente aproximar-se de nós para nos amar e salvar. Nisto somos diferentes dos judeus e de todos os outros religiosos do mundo que fazem penitência, porque tudo para nós é por causa de Jesus! Por causa d’Ele vamos jejuar, dar esmolas e nos empenhar numa vida de oração durante a Quaresma e não só! Por amor tudo submetemos ao Senhorio de Cristo!

 

E a recompensa para tudo isto? Deus recompensará no oculto e na plenitude. Ele é a motivação mais profunda e o prêmio mais desejado: «E, quando tudo lhe estiver sujeito, então também o próprio Filho renderá homenagem àquele que lhe sujeitou todas as coisas, a fim de que Deus seja tudo em todos» (1Cor 15, 28). Por fim, na perícope que nos propomos meditar também lemos: «Dias virão em que o noivo lhes será tirado. Então jejuarão» (Mt 9, 15).

 

Como conjugar essa verdade com a garantia do Ressuscitado? «Eis que estou convosco todos os dias, até o fim dos tempos» (Mt 28,20). Primeiramente, não esquecendo que a era apostólica, os responsáveis por acolher e testemunhar a Revelação fundante do Verbo Encarnado e Pascal foi única em sua experiência pessoal e comunitária com o Emanuel. Eles tiveram que realmente jejuar, não somente pela falta de apetite, causado da prisão, julgamento e morte física de Jesus na Cruz, causa de grande angústia e solidão, mas jejuaram naqueles dias do verdadeiro Pão e Alimento dado pelo Pai à humanidade (cf. Jo 6, 30-35). Por ocaisão da Ressurreição, aí sim, os últimos versículos do Evangelho de Mateus fundamentam que Jesus Cristo pode ser sempre o mesmo (cf. Hb 13, 8), em múltiplas formas de presença.

 

Sobre isso o Papa Bento XVI, em sua inesquecível primeira encíclica, quis também recordar: «Na sucessiva história da Igreja, o Senhor não esteve ausente; incessantemente, vem ao nosso encontro por meio de pessoas nas quais Ele se revela; por meio da Palavra, nos Sacramentos, especialmente na Eucaristia. Na liturgia da Igreja, na oração desta, na comunidade viva dos crentes, experimentamos o amor de Deus, sentimos a sua presença e também, deste modo, aprendemos a reconhecê-la na nossa vida cotidiana» (BENTO XVI, Deus caritas est nº 17). Por isto eles jejuaram e nós também podemos jejuar, dar esmolas, intensificarmos a nossa vida de oração e vivermos a Quaresma e toda a nossa vida.

 

Procuremos, com o auxílio do Espírito Santo, responder com amor o Amor que nos visitou, desposou-nos e quis ficar conosco para sempre no tempo e na eternidade.

 

Padre Fernando Santamaria – Comunidade Canção Nova

 

Fonte: Canção Nova.